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    [01/12/11]
    Mecanismo para resolução de conflitos beneficia os negócios

    Consolidada do ponto de vista legal, respaldada pelo Judiciário e bem recebida pelas empresas, a arbitragem pavimentou o caminho do crescimento econômico trilhado pelo país na última década e, com ajustes, pode facilitar os grandes investimentos em infraestrutura e projetos ainda necessários para o país, como aqueles previstos para a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. Essa é a avaliação sobre a justiça privada que emergiu do seminário organizado pelo Valor, "Arbitragem e Segurança Jurídica no Brasil", realizado dia 28 de novembro, em São Paulo. O evento avaliou os pontos de destaque na história da arbitragem ao longo dos últimos anos, mostrou sua importância para a criação de um ambiente de negócios saudável e apontou novos rumos para seu aprimoramento e expansão - como sua utilização para solucionar disputas sobre licitações públicas.

    Os benefícios apontados pelos palestrantes como decorrência da consolidação da arbitragem, quinze anos depois de sua instituição em lei, incluem a viabilização de um mercado de capitais com alto grau de governança, a redução da percepção de risco do país entre investidores estrangeiros e a inclusão do Brasil no mapa do grande capital internacional.

    Com um Judiciário ainda lento, abarrotado de processos, e sem perspectivas de melhora no curto prazo - como admitem os presidentes dos dois principais tribunais do país -, o Brasil precisa contar com as fórmulas alternativas de solução de conflitos se quer oferecer condições mínimas para a realização de negócios no país.

    O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes defendeu no seminário uma maior utilização da arbitragem para escapar à forma mais tradicional, e hoje ineficaz, de solução de controvérsias: o Judiciário. Segundo o ministro, são claros os déficits nos serviços públicos no Brasil, a despeito dos esforços de reforma do Estado nos últimos anos, e a prestação jurisdicional se inclui nesse quadro.

    O modelo brasileiro de organização política e social demanda muito da Justiça, na avaliação do ministro. E no contexto de ascensão social de novas classes e sua inserção na economia, a tendência é esse quadro se intensificar. Há em tramitação no país 80 milhões de processos, o que significa uma ação para cada três pessoas: "As disputas mais comezinhas, as brigas de vizinhos, vão todas parar na Justiça", diz Mendes. Para o ministro, é preciso de uma mudança institucional e cultural no sistema, é necessário pensar em modelos alternativos - daí a importância da arbitragem.

    No contexto da criação de um ambiente de segurança jurídica, Gilmar Mendes demonstrou sua preocupação com a questão das guerras de liminares em processos de licitação altamente complexos, algo que no passado ele chegou a definir como "manicômio judiciário". "Fico a pensar que um modelo de arbitragem poderia ser ideal para isso, para se criar um ambiente de segurança", disse o ministro.

    Quando há obras que precisam ser concluídas em tempo definido - como é o caso dos preparativos para Copa do Mundo, ou das megaobras no setor de energia - o caso é mais grave, e o ministro sugere o estudo de fórmulas que possam evitar a suspensão do andamento da construção ou dos processos licitatórios, baseado no próprio interesse público.

    Gilmar Mendes lembrou que no contexto da reforma do Judiciário houve conflitos sérios em torno da arbitragem, como a apresentação de uma emenda constitucional destinada a vetar o uso da arbitragem para órgãos do setor público. Como essa emenda não foi incluída, o uso da arbitragem pelo setor público, se não foi proibido, foi autorizado pelo "silêncio eloquente" da legislação.

    Mendes diz que ainda há entre os juízes um "cacoete" para recusar, em princípio, qualquer cláusula que lhe retire o poder jurisdicional, uma cultura judicialista. "Ainda não há um ethos judicial pelo reconhecimento da arbitragem", diz. A Justiça não pode ser feita a qualquer custo" - ou seja, independentemente de quanto tempo ela leve para ser feita - defende. E, apesar de a Justiça brasileira ser profissional, com quadros altamente qualificados e métodos transparentes de seleção, ainda falta especialização das cortes para certos tipos de demandas, o que também atrapalha a boa prestação jurisdicional no país - com decisões à altura de disputas mais complexas, avalia o ministro.

    O advogado Modesto Carvalhosa apresentou uma visão mais otimista da história da arbitragem no Brasil até o momento, identificando a instituição de uma boa legislação e o respeito do Judiciário às decisões arbitrais. O único problema que persiste, em sua avaliação, é a questão da execução das sentenças proferidas pela arbitragem, que devem ser encaminhadas à Justiça - e lá enfrentam o problema geral de assoberbamento do Judiciário.

    No Superior Tribunal de Justiça (STJ), diz Carvalhosa, há uma jurisprudência "excepcional" sobre a arbitragem, com precedentes que abrangem todos os aspectos do tema, decisões relevantes que confirmam a competência do instituto. Hoje, há no Brasil o pleno cumprimento do código legislativo referente à arbitragem, e o país subscreveu todos os tratados internacionais relevantes que respaldam seu funcionamento - com destaque para a Convenção de Nova York, assinada em 2002, lembrou o advogado. Há o pleno respaldo à competência dos tribunais arbitrais, assegurada pelo STF - com destaque para o julgamento que declarou a constitucionalidade da lei da arbitragem, em 2001 - e em precedentes julgados tanto pelo STJ como pelos tribunais locais.

    Carvalhosa também ressaltou o aprimoramento das câmaras de arbitragem brasileiras, com quadros competentes, experientes e com profissionais de qualidade, o que ajuda a atrair mais partes interessadas em adotar o instrumento. Tanto no Brasil quanto no exterior, o número de procedimentos instalados aumenta. A Câmara de Comércio Internacional, uma das principais instituições de arbitragem do mundo, contabilizou em 2005 o total de 35 partes brasileiras em procedimentos arbitrais, número que passou para 86 em 2009.

    A Justiça brasileira, em uma comparação com indicadores internacionais, não deixa a tanto a desejar, segundo dados apresentados por Carvalhosa: o World Justice Project, uma organização sediada em Washington e bancada por órgãos multilaterais e entidades de classe, colocou o Brasil em segundo lugar em um ranking de segurança jurídica na América Latina - atrás apenas do Chile. Mundialmente, o país ficou com o 24º lugar - pouco atrás dos EUA, em 21º lugar.

    O ministro Gilmar Mendes fez uma raciocínio na mesma linha ao apontar que o problema brasileiro não é a falta de autonomia do Judiciário, que é profissionalizado e possui pouco grau de interferência política. "Entre os Brics, o Brasil é considerado um país com instituições sérias e Justiça independente", diz Gilmar.

    Presidente do STJ, o ministro Cezar Asfor Rocha fez uma espécie de autocrítica do Judiciário, afirmando que, a despeito da receptividade do instrumento pelo tribunal, ainda não há entre os juízes uma cultura da solução de conflitos por outros meios que não a Justiça - alternativas que incluem mediação, conciliação e arbitragem. Mas houve no Brasil, de acordo com ele, um despertar para a arbitragem, trazido em grande parte pelos princípios do chamado "Consenso de Washington", que preconiza a criação de um ambiente favorável à iniciativa privada, e foi responsável pela criação dos princípios da reforma do Judiciário.

    Para mostrar o arrefecimento da resistência dos magistrados, Asfor Rocha lembrou que nas decisões já proferidas em favor da arbitragem, há reflexões exaustivas dos juízes para aceitar princípios que para o mercado são facilmente assimiláveis. Um dos debates levantados no STJ em torno da arbitragem, lembra Asfor Rocha, foi a necessidade de prestação de garantia - caução - para a execução de uma sentença arbitral estrangeira. Também houve debate para se aceitar o princípio da vinculação tácita - não expressa - da arbitragem, e foi necessário o posicionamento do STJ para se pacificar a discussão sobre a aplicação da arbitragem a empresas estatais e de economia mista.

    O conflito de competência entre câmaras arbitrais distintas ainda deve ser resolvido pelo juízo de primeira instância - algo que, defende o ministro, deveria ser decidido exclusivamente pelo STJ para se garantir a segurança jurídica. Asfor Rocha também observa que a Justiça brasileira deve discutir melhor o tema da fronteira entre o direito público e o privado no campo da arbitragem, debatendo a utilização do instrumento para resolver disputas na área trabalhista, ambiental, consumo e falências.

    A utilização da arbitragem como uma forma de desafogar o Judiciário - retirando do poder público a necessidade de resolver certas disputas entre empresas, também foi objeto de debate no evento. O consenso, entretanto, apontou que esse não é o melhor argumento em favor da expansão da arbitragem no país. O maior benefício é mesmo a melhora da segurança jurídica, garantindo decisões mais céleres e precisas para disputas sobre temas complexos.

    "A arbitragem não chega a desonerar o Judiciário em grande escala, mas serve para ajudar a resolver demandas com peculiaridades específicas", diz Gilmar Mendes. Há casos de demandas contratuais que não são resolvidas, e nem mesmo levadas à Justiça, porque não há uma previsão de solução. Nesse sentido, mesmo sem atingir um grande número de processos, a arbitragem também contribui para se fazer Justiça, diz o ministro. Modesto Carvalhosa endossa a posição: "Há um universo de milhares de contratos que não vão ao Judiciário. Nesse sentido, a jurisprudência do STF e do STJ em favor da arbitragem contribui para a segurança Jurídica".

    Asfor Rocha considerou que a instituição da arbitragem não constitui um tema de massas - por ano, entram no Brasil 20 milhões de novas ações -, mas é relevante para os proprietários do capital, e favorável ao país no sentido de construir uma imagem de um lugar que respeita contratos.

    Demonstrando a escala das disputas que chegam regularmente ao Judiciário - e a dificuldade em se solucionar o problema -, Gilmar Mendes contou sua experiência no período em que se discutia o projeto de instalação dos Juizados Especiais Federais, órgãos destinados à solução de pequenas causas contra o governo federal. Na época, começo dos anos 90, estimou-se que os juizados receberiam de 180 mil a 200 mil processos, tomando-se como base o número de disputas então presentes na Justiça Federal. Em pouco tempo, contudo, o volume de ações chegou a 2,5 milhões de processos. "Não conseguimos avaliar a dimensão da demanda reprimida", contou o ministro.

    Fernando Teixeira

    Disputas judiciais suscitam questionamento do sistema

    A rapidez na obtenção de desfechos em litígios complexos e a garantia de sigilo durante o processo tornaram a arbitragem um mecanismo extremamente popular no ambiente corporativo. Nos últimos meses, no entanto, disputas envolvendo alguns dos maiores grupos empresariais do país ganharam repercussão por levantar dúvidas sobre a validade de cláusulas de arbitragem inseridas em contratos. O temor do mercado é que, conforme o resultado final dado a esses casos, o Brasil retome a insegurança jurídica que rondou o país antes da consolidação do instrumento privado de solução de conflitos - quando a única alternativa às empresas era esperar na longa fila do Poder Judiciário até o julgamento de suas demandas. Apesar disso, especialistas no tema garantem que a arbitragem não está em perigo.

    A primeira grande disputa arbitral a chegar à Justiça e ganhar repercussão envolve a holding que controla o maior grupo privado e o braço de investimentos do terceiro maior banco brasileiros, pelo ranking Valor 1000, e os maiores fundos de pensão do país. O processo arbitral aberto no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA) entre a Bradespar, do Bradesco, a Litel, que reúne Previ, Petros, Funcef e Funcesp, e a Elétron, do empresário Daniel Dantas, já teve um desfecho, mas está sendo contestado judicialmente. As partes disputam uma fatia da Valepar - que tem 52,70% do capital ordinário da Vale -, na qual Litel, Bradespar e Elétron têm participações de 49%, 21,2% e 0,02%, respectivamente.

    No procedimento arbitral instaurado, a Elétron alega que tem direito à compra de uma parte das ações da Valepar em poder das demais empresas por causa de um aumento de capital promovido em 2002, que teria diluído sua participação. Em uma primeira sentença, a arbitragem deu vitória parcial à Elétron, mas a decisão foi contestada na Justiça pela Litel e Bradespar, que alegam que um dos árbitros já havia advogado para o empresário Daniel Dantas no passado, prestando consultoria em um processo no exterior.

    O procedimento arbitral chegou a ser suspenso pela via judicial, mas foi retomado, com a mudança do árbitro questionado, que, diante da polêmica, renunciou ao cargo. Recentemente, a sentença final da arbitragem deu à Elétron o direito de compra de parte das ações de seus sócios na Valepar. A decisão está sendo novamente contestada na Justiça, onde a Bradespar tenta anular a sentença arbitral.

    As peculiaridades do caso envolvendo a Valepar são, segundo especialistas, uma das fontes de inquietação no meio empresarial. "A preocupação maior das empresas é a de que em uma arbitragem algum árbitro esteja ligado a alguma das partes", diz a advogada especialista no tema Ana Tereza Basílio, para quem isso decorre do fato de boa parte dos árbitros serem advogados que, em algum momento, podem ter atuado, de alguma forma, para uma das partes envolvidas. "Isso pode enfraquecer a arbitragem", afirma a advogada.

    Professora do curso de pós-graduação em arbitragem da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-presidente da Câmara de Mediação e Arbitragem da seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ana Tereza acredita que essa situação poderá ser resolvida quando o Brasil, a exemplo do que já ocorre em alguns países, contar com profissionais que sejam apenas árbitros. "O incremento do uso da arbitragem no país poderá nos levar a ter mais clareza sobre a função do árbitro", ressalta ela. "O instituto se fortalecerá quando o mercado tiver uma oferta maior de profissionais que sejam só árbitros, mas ainda não chegamos nesse estágio."

    A escolha dos árbitros, no entanto, não é o único motivo que serve de argumento para que as partes contestem o uso da arbitragem. Um dos casos mais ruidosos sobre o tema no Brasil atualmente é o que contrapõe os dois maiores sócios da Odebrecht Investimentos (Odbinv), holding do Grupo Odebrecht, um dos maiores do país, segundo o ranking Valor Grandes Grupos. De um lado está a holding Kieppe, que reúne a família Odebrecht. De outro, a holding Graal, da família Gradin, sócia da empresa com 20,6% das ações do grupo baiano.

    O litígio entre os sócios, que conviveram pacificamente durante 30 anos, começou em meados do ano passado com uma alteração no acordo de acionistas proposta pelo majoritário e que alteraria a posição dos minoritários no grupo. Depois de tentativas de negociação fracassadas, a Kieppe manifestou aos Gradin o interesse em exercer a opção de compra das ações em poder da Graal. Esta, no entanto, contestou a validade do exercício, com o argumento de que as condições para a opção previstas no acordo de acionistas assinado em 2001 não se apresentavam naquele momento.

    Diante desse impasse, a Graal pediu a abertura de um procedimento de arbitragem pelo qual uma câmara arbitral seria escolhida por ambas as partes para decidir a disputa. Diante da negativa da Kieppe, a Graal foi à Justiça pedir sua instauração. Em meados de janeiro, a Justiça de primeira instância determinou a realização de uma audiência entre as partes para dar início ao processo. Mas a Kieppe recorreu da decisão e, após diversos recursos, a audiência que definirá o rumo da disputa entre as duas famílias ainda não foi realizada.

    O foco das discussões na Justiça é a forma de resolução das divergências entre os sócios da Odebrecht, ou seja, se a interpretação do acordo de acionistas assinado entre elas será feita pelo Poder Judiciário ou por meio de arbitragem. De um lado, a Graal alega que o documento prevê que qualquer dúvida ou divergência em relação ao acordo de acionistas deve ser solucionada por meio de mediação ou arbitragem - logo, a disputa deve ser levada a uma câmara arbitral. De outro, a Kieppe argumenta que a cláusula não é compromissória - ou seja, a arbitragem é apenas uma possibilidade - e que o acordo de acionistas prevê exceções, que devem ser solucionadas na Justiça.

    O texto do acordo de acionistas assinado entre os dois sócios prevê que as dúvidas ou divergências surgidas em relação ao documento deverão ser resolvidas por mediação ou arbitragem, "exceto quanto ao previsto na cláusula oitava". A cláusula oitava, por sua vez, prevê que "é ainda facultado à parte obter decisão judicial para, se for o caso, suprir a vontade da parte que se recusar a cumprir qualquer das obrigações assumidas no acordo de acionistas". Está aberta a divergência entre as partes: enquanto a Kieppe acredita que a não-aceitação do exercício de opção de compra feito por ela permitiria o uso da via judicial, a Graal entende que a discussão sobre a validade da opção de compra deve ser feita por meio da via arbitral.

    Para Arnoldo Wald, membro da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), ainda que existam situações como essa, o número de arbitragens que vai à Justiça é muito pequeno. "Tem havido pouca interferência do Judiciário, que tem prestigiado a arbitragem, cada vez mais importante diante dos 90 milhões de processos existentes na Justiça brasileira", afirma Wald. De acordo com o especialista, as decisões arbitrais anuladas na Justiça atingem apenas 2% das arbitragens realizadas no país. Esses casos, segundo ele, só têm acontecido quando há algum vício sério no contrato arbitral. Wald diz ainda que, nos casos em que os tribunais entendem que determinadas matérias não podem ser objeto de arbitragem, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem sido firme no sentido de manter completamente a validade dos procedimentos. "A arbitragem está estabelecida, está generalizada e as exceções confirmam a regra", diz. "Não há desconfiança em relação ao instituto."

    O advogado Mário Sérgio Duarte Garcia, especialista no tema e vice-presidente da Câmara de Mediação e Conciliação da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), concorda. "O fato de alguns irem a juízo não desmerece o instituto da arbitragem", diz Garcia. Segundo ele, até pode haver ilegalidades no atendimento ao que foi estipulado nos termos de arbitragens, que as sujeitam a anulações. "Mas é natural que a parte que perde uma arbitragem não se conforme com um possível resultado adverso", afirma Duarte Garcia, que atuou como árbitro no caso envolvendo a Valepar. Para a especialista Ana Tereza Basílio, esse tipo de debate em relação à arbitragem faz parte do próprio contencioso. "Quando se tem um contencioso cível na Justiça há uma série de incidentes processuais", explica. "E a arbitragem não deixa de ser um processo contencioso como qualquer outro, em todas as medidas possíveis são utilizadas pelas partes para garantir seus direitos", atesta Garcia.

    Cristine Prestes

    Adoção lenta

    A Lei de Arbitragem foi promulgada em 1996 e demorou para "pegar" de fato. Menos de um mês depois de sua edição, em 23 de setembro, o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) questionou sua constitucionalidade, durante um julgamento de um processo de homologação de sentença estrangeira. Até 2004, era o STF - e não o STJ, como hoje - a corte responsável pela análise desses pedidos.

    O processo de homologação foi apresentado em 1995 por uma empresa suíça, que tentava reconhecer no Brasil uma sentença arbitral proferida na Espanha, que tratava da remessa de royalties ao exterior. A parte contrária, uma empresa brasileira, não havia feito qualquer oposição ao reconhecimento da sentença no Brasil. Mas o então presidente do STF, Sepúlveda Pertence, recusou a homologação. Para ele, o laudo precisaria primeiro ser homologado pelo Judiciário espanhol, para depois ser reconhecido no Brasil.

    A empresa suíça recorreu e, nesse meio tempo, foi editada a Lei de Arbitragem. Entre outras vantagens, ela acabou com a exigência de homologação da sentença estrangeira pelo Judiciário do país de origem.

    O recurso da empresa suíça foi então submetido ao plenário do STF, formado por 11 ministros. Durante o julgamento, o ex-ministro Moreira Alves suscitou possíveis inconstitucionalidades na Lei de Arbitragem. A decisão final veio em dezembro de 2001. Por sete votos a quatro, os ministros concluíram que a lei era constitucional.

    Mas foi um julgamento apertado. No primeiro voto, o ministro Sepúlveda Pertence, relator do recurso, concluiu que a Lei de Arbitragem dificultava o livre acesso ao Judiciário, contrariando a Constituição. Mas a corrente vencedora entendeu que buscar o Judiciário é um direito, e não um dever. Por isso, as partes podem renunciar a esse direito, optando, de forma voluntária, pela arbitragem.

    Uma pesquisa realizada pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem com a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas levantou 790 acórdãos dos tribunais brasileiros, de 1996 a 1999, para avaliar como o Judiciário decide as ações ligadas à arbitragem. A conclusão foi que o Judiciário contribui para sua correta aplicação e fortalecimento.

    Maíra Magro

    Sistema fez o mercado nacional ser visto com mais confiança

    A segurança jurídica e a adoção de meios alternativos de resolução de conflitos em tempo hábil compõem os principais fatores que levam o investidor a aplicar em um país. Além do instituto jurídico, constam dessa lista de requisitos a atitude amistosa ao capital estrangeiro; ter uma moeda confiável porque o investimento é de médio-longo prazo e a previsibilidade de que as regras do jogo não mudarão no meio do caminho.

    A afirmação foi de Roberto Teixeira da Costa, presidente da Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM), em palestra no seminário Arbitragem e Segurança Jurídica no Brasil realizado pelo Valor segunda-feira, em São Paulo. Segundo Costa, a adoção do sistema de arbitragem no Brasil permitiu que o investidor estrangeiro olhasse com mais confiança para o mercado nacional: somente até outubro deste ano, foram recebidos US$ 50,4 bilhões de investimento de capital direto, em comparação a US$ 48,4 bilhões de 2010. A estimativa para 2012 é de US$ 70 bilhões.

    "Entre maio de 2004 e julho de 2011, o Novo Mercado mobilizou recursos da ordem de R$ 121 bilhões em IPOs (Initial Public Offering). Em média, 70% das subscrições foram feitas por investidor estrangeiro. "Tenho certeza de que sem a cláusula de arbitragem esse volume não teria sido conseguido. A criação da CAM foi instrumento poderoso para o Brasil dar esse grande salto", destacou Costa.

    A CAM, que teve recentemente seu regulamento alterado, atua na administração de procedimentos arbitrais originários de conflitos surgidos no âmbito das companhias comprometidas com a adoção de práticas diferenciadas de governança corporativa e transparência, cujas ações são listadas na BM&F Bovespa, e também em outros litígios entre pessoas físicas e jurídicas, desde que sejam referentes a direito empresarial.

    Embora esteja aberta à resolução de conflitos de companhias de capital aberto, as principais demandas referem-se a empresas de capital fechado, segundo Costa. "A primeira leitura que fazemos para esse fato é a que a governança no Brasil está criando um ambiente no qual os litígios estão sendo resolvidos fora da Câmara Arbitral porque muitas pendências são solucionadas por contato direto com a CVM e isso acaba sendo um anteparo - uma primeira instância antes da Câmara - talvez isso explique porque não temos grandes casos envolvendo empresas de Novo Mercado."

    Apesar de sua aceitação, a aplicação da arbitragem no Brasil não está livre de questionamentos. Um deles, lista o advogado Carlos Alberto Carmona, refere-se à cláusula arbitral estatutária. O jurista esclareceu que quando os acionistas já deliberaram sobre essa cláusula incorporando-a ao estatuto, ela obriga todos os acionistas. "É como qualquer outra deliberação da companhia", explica.

    "O grande problema dessa matéria é saber se eu posso, por votação de maioria, estabelecer essa mudança no estatuto. Se eu puder, será que aqueles que não concordaram podem pedir o direito de retirada? Essa é a discussão que se trava hoje. Afinal de contas, estamos tratando de um direito constitucional que é o acesso ao poder Judiciário. A rigor, de duas uma: ou eu concordo com a decisão da maioria e vou exercer o meu direito de recesso ou então vou exigir a unanimidade dos acionistas na votação, o que você nunca vai conseguir a não ser quando se constitui uma companhia", disse Carmona. Caso a cláusula estatutária já exista e ocorra uma arbitragem, todos estão vinculados, ainda que não concordem, afirmou o advogado. "Não há como fazer valer a decisão para uns acionistas e outros não. Ou vale para todo mundo ou não vale para ninguém."

    O advogado afirmou que em termos de segurança jurídica, o Brasil conseguiu avançar um patamar uma vez que o Poder Judiciário assegurou todos os meios alternativos de solução de controversas, dando força à mediação, conciliação e arbitragem. "Você tem uma fórmula garantística de resolver controvérsia, ou seja, as garantias processuais do devido processo legal em que você terá o direito de expor a sua causa, produzir a sua prova e vai ter o direito de livremente convencer o julgador. Isso acontece tanto na arbitragem quanto no Judiciário."

    Historicamente, contou o advogado Pedro Batista Martins, na medida em que o país se tornou mais atuante no comércio internacional, aumentou a pressão para a utilização da arbitragem na solução de conflitos. "Esse instituto começou a se cristalizar como mecanismo na engrenagem no fluxo de capitais", disse. Ele lembrou que a adoção desse instituto foi relevante, especialmente no momento em que ocorreram as privatizações no Brasil. Primeiro, no setor de petróleo e depois das telecomunicações. "Em 2004, vieram as PPPs (Parcerias Público-Privadas) e em 2009 os contratos de transporte de gás natural e todos eles têm a arbitragem como condição essencial."

    Maria Carolina Nomura

    Instâncias superiores dão legitimidade ao sistema

    Desde que a Lei de Arbitragem (Lei 9.307) foi publicada em 1996, é o Judiciário que vem cumprindo o papel de legitimar sua aplicação. O primeiro passo nesse sentido foi a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2001. Com a lei referendada, a tarefa de solucionar as dúvidas decorrentes de seu uso foi transferida ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

    O STJ assumiu a tarefa com extraordinária felicidade, e vem proferindo decisões construtivas favoráveis à arbitragem, entendendo que ela é necessária e indispensável ao futuro do país", afirma o professor Arnoldo Wald, vice-presidente do Comitê Brasileiro da Câmara de Comércio Internacional (CCI), com sede em Paris, instituição pioneira no mundo inteiro na solução de controvérsias comerciais.

    Em um de seus principais "leading cases" sobre arbitragem, o STJ reconheceu a validade da cláusula compromissória - instrumento de contrato pelo qual as partes se comprometem a submeter eventuais conflitos a esse método de solução de controvérsias. A dúvida era: quando um contrato tiver uma cláusula compromissória, a discussão poderá ser levada, alternativamente, ao Judiciário?

    Em 2003, a 3ª Turma do STJ decidiu que não, ao analisar um processo que ficou conhecido como "caso Americel". O julgamento definiu que, se houver cláusula compromissória em contrato, uma parte não pode desistir da arbitragem e entrar na Justiça. A ação havia sido proposta por oito representantes de telefonia celular contra a Americel, operadora da região Centro-Oeste.

    Elas tentavam instaurar um procedimento de arbitragem alegando que a Americel teria descumprido o contrato de representação. Mas a operadora se negou a comparecer a uma câmara de arbitragem do Distrito Federal e recorreu ao Judiciário.

    A 3ª Turma do STJ entendeu que o assunto deveria ser necessariamente resolvido pela arbitragem, já que os contratos discutidos tinham cláusulas compromissórias. Mesmo sem caráter vinculante, o entendimento passou a servir de parâmetro para magistrados de primeira e segunda instância.

    A decisão foi considerada relevante porque, até então, o posicionamento dos tribunais não era unânime - o que enfraquecia o uso da arbitragem. O Superior Tribunal de Justiça também esclareceu na ocasião que, quando houver cláusula compromissória em contrato e uma das partes se recusar a participar da arbitragem, o Judiciário poderá determinar a instauração do procedimento arbitral.

    "O Judiciário atua numa ponta e na outra da arbitragem", afirma o jurista Modesto Carvalhosa. De um lado, diz Carvalhosa, os tribunais brasileiros vêm garantindo a instauração da arbitragem, quando há compromisso firmado entre os contratantes. De outro, o Judiciário vem reconhecendo a validade das sentenças arbitrais.

    "Quinze anos depois da promulgação da Lei de Arbitragem, houve uma evolução enorme com sua aceitação pelo STF, um grande incentivo do STJ com posicionamentos em favor da arbitragem, além de jurisdições que cada vez mais respeitam o mecanismo e um número cada vez maior de câmaras arbitrais", afirma o jurista.

    Outra discussão importante solucionada pelo Supremo Tribunal de Justiça envolveu a retroatividade da Lei de Arbitragem. Ações judiciais questionavam se cláusulas compromissórias em contratos anteriores a novembro de 1996, data em que a norma entrou em vigor, teriam ou não validade - ou seja, se obrigariam ou não as partes a recorrer à arbitragem e não ao Judiciário, em caso de conflito.

    A jurisprudência divergiu durante uma década. Até chegar à conclusão de que tem, sim, caráter retroativo, devido à sua natureza processual. Com essa definição, as cláusulas arbitrais anteriores a 1996 também ganharam caráter vinculante.

    A decisão definitiva nesse sentido foi tomada em 2007 pela Corte Especial do STJ, na análise de um caso em que a Mitsubishi pedia a homologação de uma sentença arbitral emitida no Japão, contrária à importadora e distribuidora brasileira Evadin.

    A Evadin argumentou no processo que não estaria submetida à sentença arbitral porque, quando da data da assinatura do contrato, a Lei de Arbitragem brasileira ainda não havia entrado em vigor. Mas o STJ entendeu de maneira contrária. "Foi um debate interessante, pois a Corte mudou de opinião em relação ao seu posicionamento anterior", ressalta a advogada Selma Ferreira Lemes, especialista em arbitragem e autora de diversas pesquisas sobre a jurisprudência brasileira em torno desse tema.

    Em 2003, ao julgar um caso da Campari, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça havia entendido que a Lei de Arbitragem não se aplicaria a negócios feitos antes de sua entrada em vigor. A empresa tentava impedir um antigo parceiro comercial de discutir divergências no Judiciário, já que o contrato tinha uma cláusula arbitral.

    Em outro "leading case" analisado pelo STJ, a empresa suíça L'Aiglon queria homologar uma sentença arbitral proferida na Inglaterra, contrária à importadora Têxtil União. A importadora tentou evitar a homologação, argumentando que, no contrato, não constava sua concordância expressa com a cláusula compromissória - o que, de acordo com ela, anularia inclusive a decisão arbitral.

    Durante o julgamento, os integrantes da Corte Especial do STJ mencionaram que a importadora compareceu ao juízo arbitral e apresentou defesa, sem questionar a cláusula compromissória naquele momento. Para o tribunal, a atitude indicou uma aceitação implícita da cláusula compromissória. "O Superior Tribunal de Justiça tem a noção da importância de seu papel para o comércio internacional, sabe que suas decisões são direcionadoras e têm reflexo na economia", diz Selma Lemes.

    A função do STJ de homologar sentenças estrangeiras foi definida em 2004, pela Emenda Constitucional 45. Antes disso, a competência era do Supremo Tribunal Federal. A atuação do STJ foi marcada desde então pelo respeito aos princípios da Convenção de Nova York, firmada em 1958 no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). A convenção garante que sentenças arbitrais proferidas no exterior sejam reconhecidas no Brasil, e vice-versa. O texto trouxe agilidade ao procedimento arbitral, ao acabar com a necessidade de homologação de laudos de arbitragem pelo Judiciário do país onde foram proferidos.

    Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça deu mais um passo em sua interpretação da arbitragem. Em junho deste ano, a 3ª Turma decidiu que sentenças de câmaras internacionais proferidas no Brasil são decisões nacionais, e não estrangeiras. Portanto, não precisam de homologação pelo Judiciário brasileiro para que sejam executadas no país.

    O caso envolvia uma sentença arbitral proferida no Rio de Janeiro, em língua portuguesa, pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Francisco Rezek, seguindo o regulamento da Corte de Arbitragem da CCI, com sede em Paris.

    A 3ª Turma do STJ entendeu, por unanimidade, que o critério para definir a nacionalidade da sentença arbitral é o território no qual ela foi proferida. A relatora foi a ministra Nancy Andrighi, autora de diversos votos considerados relevantes para o reconhecimento da arbitragem pelo Judiciário brasileiro.

    Em outro precedente recente, também de relatoria da ministra Nancy Andrighi, a 3ª Turma definiu em outubro que não há nenhum impedimento para aplicar a arbitragem às empresas de economia mista. A Corte concluiu no mesmo julgamento que o compromisso pelo qual os contratantes decidem submeter-se à arbitragem é válido, mesmo que não haja previsão de uso desse método no edital de licitação ou no contrato.

    O caso envolveu a Compagas, concessionária responsável pela distribuição de gás natural canalizado no Paraná, e o Consórcio Carioca Passarelli, formado pela Carioca Engenharia e a Construtora Passarelli. Diante de uma decisão arbitral desfavorável, a Compagas questionou na Justiça a validade do compromisso arbitral (documento posterior ao contrato pelo qual os negociantes optam pela arbitragem). A companhia alegava que, como não havia previsão de arbitragem no edital de licitação, a sentença seria nula. Mas o STJ rejeitou os argumentos.

    "A segurança jurídica de um país, p

    Desde que a Lei de Arbitragem (Lei 9.307) foi publicada em 1996, é o Judiciário que vem cumprindo o papel de legitimar sua aplicação. O primeiro passo nesse sentido foi a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2001. Com a lei referendada, a tarefa de solucionar as dúvidas decorrentes de seu uso foi transferida ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

    "O STJ assumiu a tarefa com extraordinária felicidade, e vem proferindo decisões construtivas favoráveis à arbitragem, entendendo que ela é necessária e indispensável ao futuro do país", afirma o professor Arnoldo Wald, vice-presidente do Comitê Brasileiro da Câmara de Comércio Internacional (CCI), com sede em Paris, instituição pioneira no mundo inteiro na solução de controvérsias comerciais.

    Em um de seus principais "leading cases" sobre arbitragem, o STJ reconheceu a validade da cláusula compromissória - instrumento de contrato pelo qual as partes se comprometem a submeter eventuais conflitos a esse método de solução de controvérsias. A dúvida era: quando um contrato tiver uma cláusula compromissória, a discussão poderá ser levada, alternativamente, ao Judiciário?

    Em 2003, a 3ª Turma do STJ decidiu que não, ao analisar um processo que ficou conhecido como "caso Americel". O julgamento definiu que, se houver cláusula compromissória em contrato, uma parte não pode desistir da arbitragem e entrar na Justiça. A ação havia sido proposta por oito representantes de telefonia celular contra a Americel, operadora da região Centro-Oeste.

    Elas tentavam instaurar um procedimento de arbitragem alegando que a Americel teria descumprido o contrato de representação. Mas a operadora se negou a comparecer a uma câmara de arbitragem do Distrito Federal e recorreu ao Judiciário.

    A 3ª Turma do STJ entendeu que o assunto deveria ser necessariamente resolvido pela arbitragem, já que os contratos discutidos tinham cláusulas compromissórias. Mesmo sem caráter vinculante, o entendimento passou a servir de parâmetro para magistrados de primeira e segunda instância.

    A decisão foi considerada relevante porque, até então, o posicionamento dos tribunais não era unânime - o que enfraquecia o uso da arbitragem. O Superior Tribunal de Justiça também esclareceu na ocasião que, quando houver cláusula compromissória em contrato e uma das partes se recusar a participar da arbitragem, o Judiciário poderá determinar a instauração do procedimento arbitral.

    "O Judiciário atua numa ponta e na outra da arbitragem", afirma o jurista Modesto Carvalhosa. De um lado, diz Carvalhosa, os tribunais brasileiros vêm garantindo a instauração da arbitragem, quando há compromisso firmado entre os contratantes. De outro, o Judiciário vem reconhecendo a validade das sentenças arbitrais.

    "Quinze anos depois da promulgação da Lei de Arbitragem, houve uma evolução enorme com sua aceitação pelo STF, um grande incentivo do STJ com posicionamentos em favor da arbitragem, além de jurisdições que cada vez mais respeitam o mecanismo e um número cada vez maior de câmaras arbitrais", afirma o jurista.

    Outra discussão importante solucionada pelo Supremo Tribunal de Justiça envolveu a retroatividade da Lei de Arbitragem. Ações judiciais questionavam se cláusulas compromissórias em contratos anteriores a novembro de 1996, data em que a norma entrou em vigor, teriam ou não validade - ou seja, se obrigariam ou não as partes a recorrer à arbitragem e não ao Judiciário, em caso de conflito.

    A jurisprudência divergiu durante uma década. Até chegar à conclusão de que tem, sim, caráter retroativo, devido à sua natureza processual. Com essa definição, as cláusulas arbitrais anteriores a 1996 também ganharam caráter vinculante.

    A decisão definitiva nesse sentido foi tomada em 2007 pela Corte Especial do STJ, na análise de um caso em que a Mitsubishi pedia a homologação de uma sentença arbitral emitida no Japão, contrária à importadora e distribuidora brasileira Evadin.

    A Evadin argumentou no processo que não estaria submetida à sentença arbitral porque, quando da data da assinatura do contrato, a Lei de Arbitragem brasileira ainda não havia entrado em vigor. Mas o STJ entendeu de maneira contrária. "Foi um debate interessante, pois a Corte mudou de opinião em relação ao seu posicionamento anterior", ressalta a advogada Selma Ferreira Lemes, especialista em arbitragem e autora de diversas pesquisas sobre a jurisprudência brasileira em torno desse tema.

    Em 2003, ao julgar um caso da Campari, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça havia entendido que a Lei de Arbitragem não se aplicaria a negócios feitos antes de sua entrada em vigor. A empresa tentava impedir um antigo parceiro comercial de discutir divergências no Judiciário, já que o contrato tinha uma cláusula arbitral.

    Em outro "leading case" analisado pelo STJ, a empresa suíça L'Aiglon queria homologar uma sentença arbitral proferida na Inglaterra, contrária à importadora Têxtil União. A importadora tentou evitar a homologação, argumentando que, no contrato, não constava sua concordância expressa com a cláusula compromissória - o que, de acordo com ela, anularia inclusive a decisão arbitral.

    Durante o julgamento, os integrantes da Corte Especial do STJ mencionaram que a importadora compareceu ao juízo arbitral e apresentou defesa, sem questionar a cláusula compromissória naquele momento. Para o tribunal, a atitude indicou uma aceitação implícita da cláusula compromissória. "O Superior Tribunal de Justiça tem a noção da importância de seu papel para o comércio internacional, sabe que suas decisões são direcionadoras e têm reflexo na economia", diz Selma Lemes.

    A função do STJ de homologar sentenças estrangeiras foi definida em 2004, pela Emenda Constitucional 45. Antes disso, a competência era do Supremo Tribunal Federal. A atuação do STJ foi marcada desde então pelo respeito aos princípios da Convenção de Nova York, firmada em 1958 no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). A convenção garante que sentenças arbitrais proferidas no exterior sejam reconhecidas no Brasil, e vice-versa. O texto trouxe agilidade ao procedimento arbitral, ao acabar com a necessidade de homologação de laudos de arbitragem pelo Judiciário do país onde foram proferidos.

    Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça deu mais um passo em sua interpretação da arbitragem. Em junho deste ano, a 3ª Turma decidiu que sentenças de câmaras internacionais proferidas no Brasil são decisões nacionais, e não estrangeiras. Portanto, não precisam de homologação pelo Judiciário brasileiro para que sejam executadas no país.

    O caso envolvia uma sentença arbitral proferida no Rio de Janeiro, em língua portuguesa, pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Francisco Rezek, seguindo o regulamento da Corte de Arbitragem da CCI, com sede em Paris.

    A 3ª Turma do STJ entendeu, por unanimidade, que o critério para definir a nacionalidade da sentença arbitral é o território no qual ela foi proferida. A relatora foi a ministra Nancy Andrighi, autora de diversos votos considerados relevantes para o reconhecimento da arbitragem pelo Judiciário brasileiro.

    Em outro precedente recente, também de relatoria da ministra Nancy Andrighi, a 3ª Turma definiu em outubro que não há nenhum impedimento para aplicar a arbitragem às empresas de economia mista. A Corte concluiu no mesmo julgamento que o compromisso pelo qual os contratantes decidem submeter-se à arbitragem é válido, mesmo que não haja previsão de uso desse método no edital de licitação ou no contrato.

    O caso envolveu a Compagas, concessionária responsável pela distribuição de gás natural canalizado no Paraná, e o Consórcio Carioca Passarelli, formado pela Carioca Engenharia e a Construtora Passarelli. Diante de uma decisão arbitral desfavorável, a Compagas questionou na Justiça a validade do compromisso arbitral (documento posterior ao contrato pelo qual os negociantes optam pela arbitragem). A companhia alegava que, como não havia previsão de arbitragem no edital de licitação, a sentença seria nula. Mas o STJ rejeitou os argumentos.

    "A segurança jurídica de um país, para receber investimento estrangeiro, por exemplo, se mede hoje pelo respeito ao instituto da arbitragem", diz o jurista Modesto Carvalhosa. "Se o país respeita a arbitragem, o nível da segurança jurídica aumenta muito", diz Carvalhosa, para quem o Judiciário brasileiro vem cumprindo esse papel.

    Maíra Magro

    Fonte: VALOR ECONÔMICO - ESPECIAL


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