[29/09/11]
Para esfriar crise, STF adia julgamento que pode limitar poder de corregedoria
A crise no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a ameaça do Congresso de intervir no caso levaram ontem os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a buscar um acordo sobre as competências do órgão de controle externo. Pelo que foi acertado, as corregedorias dos tribunais locais terão um prazo determinado para tomar providências sobre denúncias contra os magistrados. Somente quando esgotado esse prazo, e se não houver nenhuma medida concreta, a Corregedoria Nacional terá carta branca para processar o juiz suspeito de irregularidade e cobrar responsabilidades do corregedor local.
O acordo vinha sendo discutido havia alguns dias em conversas separadas e reservadas entre ministros da corte. Mas a crise entre a corregedora nacional, ministra Eliana Calmon, e o presidente do STF, Cezar Peluso, precipitou o entendimento. Eliana, em entrevista, apontou a existência de “bandidos de toga” e foi repreendida por Peluso. A tensão máxima na cúpula do Judiciário levou ao adiamento ontem da votação da ação movida pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), que quer ver reduzidos os poderes do CNJ.
Quem faz as vezes de mediador é o ministro Gilmar Mendes. O acordo deverá estar expresso no voto do ministro Luiz Fux, em data ainda não definida, pois cabe ao presidente do STF decidir quando o caso voltará à pauta. Conforme as regras da corte, todos os ministros votam e expressam seus pontos de vista. Assim, Fux expressará seu entendimento do caso e marcará o “voto vencedor”.
Nessas conversas reservadas, os ministros perceberam que um meio-termo seria viável. Passaram a discutir a necessidade de estabelecer um critério objetivo para a atuação das corregedorias dos tribunais locais e do CNJ. Sem a definição de prazos, as corregedorias locais, que não funcionam, levavam a passos lentos as investigações, uma forma de contribuir para a prescrição das acusações contra os magistrados. Quando percebia a manobra, o CNJ avocava o processo, mas acabava sendo acusado de interventor pelos tribunais locais. Com a definição de critérios objetivos, o CNJ poderá cobrar responsabilidade dos corregedores locais e terá reconhecida competência para investigar juízes quando perceber que manobras corporativistas contribuirão para a impunidade.
Antes do julgamento de ontem, o ministro Gilmar Mendes já antecipava que um acordo estava próximo. Disse não haver discórdia irremediável entre os que defendem a tese de que o CNJ pode abrir processos contra magistrados, independentemente de terem sido investigados pelas corregedorias locais, e os que encampam a ideia de que só os tribunais locais têm competência para instaurar investigações contra os magistrados.
“Não vejo que haja antinomia absoluta entre aqueles que preconizam uma ação efetiva do Judiciário e os que defendem a subsidiariedade (quando o CNJ atua apenas de forma auxiliar aos tribunais). A subsidiariedade também é um conceito relativo: significa dizer que o órgão que está mais próximo, que está em condições de atuar, deve fazê-lo. Se ele não o fizer, o outro terá de exercer sua função”, afirmou Gilmar Mendes.
Acordo. O pacto informal entre os ministros pode encerrar a polêmica que culminou na reação ontem de todos os conselheiros do CNJ às declarações da ministra Eliana Calmon. Em entrevista à Associação Paulista de Jornais (APJ), ela afirmou haver na Justiça “bandidos de toga”. A reação do CNJ foi capitaneada pelo presidente do Supremo, Cezar Peluso. Em nota aprovada por unanimidade, o conselho repudiou as declarações que considerou levianas.
Pressão corporativa está por trás da ideia de mudar CNJ
A atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)em seis anos de funcionamento resultou em 50 condenações, incomodando refratários à apuração e punição de supostas irregularidades cometidas por magistrados. Inconformados recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a imposição de limites.
A decisão que o STF deve tomar nas próximas semanas poderá fixar parâmetros objetivos para a atuação do CNJ em relação aos processos nos quais magistrados são acusados de irregularidades. Na prática, isso já funcionana corregedoria.Dos pedidos de investigação que chegam ao conselho por não terem sido apurados nos tribunais locais, 90% são devolvidos. Apenas 10% são imediatamente investigados pela corregedoria, entre outros motivos, porque autoridades do tribunal local deixaram claro que não têm condições de fazer a apuração.
Adefinição da atuaçãodo CNJ poderá ter como base sugestões de integrantes do órgão.O conselheiro José Lúcio Munhoz, juiz trabalhista em Santa Catarina, propôs recentemente a fixação de prazo de 140 dias para que os tribunais locais concluamos processos disciplinares. Uma eventual prorrogação do prazo seria analisada pelo conselho.Se o tribunal local não tomasse uma decisão, o CNJ entraria no caso.
O CNJ aplicou até agora 24 vezes a pena máxima administrativa– aposentadoria compulsória. Seis magistrados foram colocados em disponibilidade e três foram removidos cautelarmente. Em dois casos, o CNJ resolveu aplicar a pena de censura e em15 os magistrados foram afastados de suas funções.
Entre essas condenações está a aposentadoria compulsória do juiz Abrahão Lincoln Sauáia, do Maranhão, acusado de omissão, negligência e parcialidade no julgamento de processos envolvendo grandes empresas. Em um processo, o juiz determinou à Vasp indenização de R$ 1,7 milhão a um passageiro que teve a mala extraviada.
Hoje,tramitam no CNJ 14 processos administrativos e 38 sindicâncias. Entre os investigados há seis desembargadores.
Senado quer lei para garantir poder do CNJ
Ameaçado no Supremo Tribunal Federal (STF), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ganhou apoio no Senado com a proposta de emenda à Constituição que "devolve" ao órgão a competência que ele vinha exercendo até agora, de "processar, julgar e punir" juízes envolvidos em irregularidades. De iniciativa do líder do DEM, senador Demóstenes Torres (GO), o texto "reescreve" os artigos da Constituição que abordam o tema para deixar claro que o Congresso atribui ao órgão a prerrogativa de exercer o controle do Poder Judiciário.
Demóstenes afirma que se o Supremo retirar a competência de julgar do Conselho, passará para a opinião pública o recado de que a Lei da Ficha Limpa só vale para deputados e senadores. "Quer dizer que Ficha Limpa é só para deputados e senadores e não para os juízes?, questionou."Se o STF entende que esses artigos foram indevidamente redigidos, podermos corrigir sem qualquer afronta ao tribunal", disse, referindo-se à polêmica sobre o alcance da atual redação do dispositivo constitucional.
A reação contra o Supremo terminou gerando uma aliança entre os governistas e os senadores da oposição. No plenário, o líder do PT, Humberto Costa (PE), avaliou que será "um malefício muito grande para o País" retirar do conselho a competência que vem exercendo desde a sua criação".
O tema começou a ser debatido pela manhã, na reunião da Comissão de Constituição e Justiça. Ex-procurador da República, o senador Pedro Taques (PDT-MT), argumentou que, se for esvaziado, o conselho se transformará " num órgão de estatísticas do Judiciário". Partiu dele e dos senadores Vital do Rego (PMDB-PB) a iniciativa de convidar para depor, na próxima semana, o presidente do Supremo, ministro Cézar Peluso, a corregedora do conselho, ministra Eliana Calmon, e o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante.
O líder do PSDB, senador Alvaro Dias (PR), pediu "prioridade" na votação da emenda. Segundo ele, para retirar dúvidas e evitar constrangimento entre os Poderes e definir claramente a responsabilidade do CNJ
FELIPE RECONDO
MARIÂNGELA GALLUCCI
ROSA COSTA
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO - NACIONAL
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