[19/09/11]
Na Justiça por um transplante
João Antônio, de 2 anos, Ana Beatriz, de 6, e Rafaella, de 26, não são paulistanos, mas se mudaram para São Paulo pelo mesmo motivo: os três foram diagnosticados com leucemia e, apesar de terem plano de saúde, precisaram recorrer à Justiça para serem transplantados no Hospital Sírio-Libanês, considerado de excelência na área.
As histórias dos três se cruzaram ao acaso e envolvem meses de ansiedade, angústia e batalha judicial contra as operadoras de saúde - que, no caso deles, por contrato, não daria direito de eles serem atendidos nesse hospital.
João Antônio mora no Rio e foi diagnosticado com um tipo raro de leucemia após uma febre que não sarava. "O caso dele é tão raro que só um transplante de sangue de cordão resolveria", conta a mãe, Vivian de Miranda Picolo, de 31 anos.
Filha de médico, Vivian decidiu pesquisar hospitais de referência nesse tipo de transplante e médicos especializados nessa rara apresentação da leucemia. Foi aí que chegaram ao hematologista Vanderson Rocha, responsável pela equipe de transplantes de medula do Sírio-Libanês.
Como o plano de saúde não cobria, a família pagou por uma consulta. "Após a conversa com o médico tive a certeza de que meu filho seria transplantado ali. O plano não cobria, mas eu daria um jeito", diz Vivian. Ela procurou a operadora, mas não conseguiu entrar em acordo. Por isso, recorreu à Justiça.
Em junho saiu a decisão - favorável ao pequeno João. Imediatamente mãe, filho, avó e babá vieram para São Paulo. O transplante foi feito em16 de julho, mas o menino rejeitou o cordão. A única alternativa seria, então, tentar um transplante haploidêntico: a mãe seria doadora, embora fosse apenas 50% compatível.
O procedimento foi em 24 de agosto e no último dia 7 veio a boa notícia: deu certo. Desde então, a família envia relatórios para a operadora do plano de saúde com os valores a serem pagos. "A opção de fazer o transplante no Sírio não era um luxo. Era uma necessidade. E, como eu pago plano de saúde, não fazia sentido entrar numa fila do SUS", diz.
Também carioca, Ana Beatriz foi diagnosticada logo após o carnaval. Ao contrário de João, sua primeira opção de tratamento era fazer quimioterapia. Nessa época, a menina estava sendo atendida em hospitais do plano de saúde. "A expectativa era de que a doença entrasse em remissão após as duas primeiras doses", conta a professora Kátia Ferreira Moreira, 42, mãe da menina. Mas isso não aconteceu.
Ana Beatriz estava com uma leucemia refratária - não respondia ao protocolo de tratamento. O transplante era necessário, a irmã seria a doadora. Por causa da gravidade, a mãe procurou alguém especializado. E também chegou à equipe do Sírio.
O plano de saúde de Kátia recusou a cobertura do transplante no hospital. "A gente não queria o hospital. A gente queria a experiência da equipe. Não dava para fazer em qualquer lugar. Entramos na Justiça, e a liminar saiu duas horas depois", conta.
O plano tentou cassar a liminar três vezes e até a polícia entrou na história. O transplante, feito no dia 31 de agosto, foi considerado um sucesso. Uma nova audiência judicial está marcada para outubro. "A Bia está bem, fizemos bolo para comemorar os resultados. Não creio que a liminar caiará", diz Kátia.
Rafaella Serrano Teixeira é de Belém (PA) e brigou durante cinco meses com o plano de saúde para ser transplantada no Sírio. A operadora recorreu três vezes. Agora, Rafaella está reunindo a documentação necessária para dar entrada no hospital no fim do mês. "Deu certo, mas foram meses sem dormir", diz.
Excelência
De 2010 até agora, o Sírio já teve de atender oito casos de transplantes por decisão judicial. Yana Novis, coordenadora do grupo de onco-hematologia, diz que o hospital não incentiva os pacientes a recorrerem à Justiça e afirma que a unidade apenas cumpre as decisões. "Nesse tipo de caso, o pagamento fica comprometido, então o ideal é que haja um acordo com o plano", diz. Segundo Yana, um transplante pode custar até R$ 500 mil.
Fernanda Bassette
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO - VIDA & - 18.9.2011
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